quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

PCAA: O Modelo Real da Nossa “Educação”?


Fonte: Diálogo

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 Na linha de abordagem de nossas publicações temos proposto uma reflexão sobre as multifacetadas questões que envolvem o modelo atual da Educação em nosso país, na busca de uma visão sistêmica que oriente ações transformadoras consistentes.
Foi com indignação que publicamos a má gestão dos recursos públicos na Educação. Foi com espanto que apontamos a tentativa do Consed – Conselho Nacional dos Secretários Estaduais de Educação – de reverter o piso salarial do professor. Foi com inquietação e estranhamento que consideramos a síndrome de Burnout um sintoma da insanidade da nossa sociedade. E foi com emoção que lemos o depoimento da Profª. Guilhermina Borges de Araujo a quem agradecemos por conferir assertividade às reflexões que propomos e às contribuições que almejamos oferecer.
Nesse sentido, continuamos nossas reflexões sobre o modelo de Educação que, de fato, se instaurou em nosso país, mapeando as interfaces que configuram o nosso sistema educacional. Nesse momento, o protagonismo ocorre no âmbito das famílias: alunos e pais, ambos em interação complementar reveladora. 
O jornal O Estado de São Paulo publicou (13/11/2008), em seu caderno Metrópole, duas reportagens estarrecedoras: “Alunos brigam, trancam professores e quebram escola na zona leste de SP” – Maria Rehder e “Só nesse ano, 50 ocorrências desse tipo” – Rodrigo Brancatelli.
Na primeira, um grupo de alunos, segundo funcionários da escola, autodenominado PCAA (Primeiro comando do Amadeu Amaral – Escola Estadual Amadeu Amaral – Belém, zona leste de São Paulo) se autorizou a atos de depredação da escola em um vandalismo só referenciado nas ações do crime organizado. A questão que se coloca é o modelo delinquente que está orientando os processos de aprendizagem desses adolescentes enquanto o Estado de Direito permanece inerte e omisso. Se antes, os padrões criminosos orientavam o mundo do crime e dominavam as populações carcerárias, agora, mobilizam lideranças jovens que trazem para o espaço escolar as práticas contrárias aos valores humanos e humanizadores que deveriam alicerçar o convívio na escola. O medo e a lei do silêncio se impõem: funcionários da escola relatam na reportagem que não registram as recorrentes ocorrências – invasões, incêndios e depredações – por medo de represálias dos alunos. 
Mas esse não é um caso isolado, a segunda reportagem relata as agressões a professores: ameaças e ataques que vêm sofrendo nos últimos anos. De janeiro a setembro de 2008, segundo informação da própria Secretária de Educação, foram registradas 50 ocorrências de violência nas escolas. Em 2007, foram registradas 180 e em 2006, 217. São dados alarmantes. Qual o significado desses dados: a diminuição das ocorrências ou dos seus registros? Tudo indica que a desesperança diante dos desdobramentos da violência e a certeza da inoperância do Estado confirmam a lei do silêncio referida acima e explica o número decrescente dos registros dessas ocorrências.
Outro dado significativo apontado nessa reportagem é a agressão física sofrida por uma professora, não mais cometida por um aluno, mas por uma mãe. A aprendizagem do comportamento agressivo e violento se inicia na família e ao desdobrar-se na escola sem uma interferência consistente e eficaz acaba gangrenando todo o tecido social. É o que temos observado!
A violência não está circunscrita à rede de ensino pública. São inúmeros os relatos de agressão psicológica, moral e física também nas escolas privadas incluindo as de alto padrão o que significa que a violência não está referenciada na condição socioeconômica das famílias, mas no sistema de valores que alicerça as suas relações interpessoais. 
Na mesma página das reportagens acima, há uma nota de Humberto Maia Júnior: “Para especialistas, educar é melhor do que punir”. Segundo essa nota, para o coordenador do Núcleo de Criminalidade Infanto-Juvenil da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Leonardo Pantaleão, “A lei do mais forte é mais valorizada do que os padrões éticos da sociedade”. Sabemos que o padrão ético na nossa sociedade, apreendido na família pela mediação dos pais, é pautado na lei do mais forte que impõe, valoriza e perpetua a diferença e o poder do forte sobre o fraco, por isso a ética dos valores humanos e humanizadores visando o bem comum é apenas um discurso que não se realiza na prática.
Ainda na mesma nota, a socióloga da USP Caren Ruotti diz que a escola tem que assumir o papel de educador e “Quando estimulados de forma positiva, os jovens também agem assim”. Do ponto de vista teórico, concordamos com a Profª. Caren, mas reafirmamos a nossa posição já explicitada nesse blog: no que tange à Educação, a aprendizagem reflexiva na universidade deve estar sustentada pela experiência da interação com a realidade da sala de aula. A complexidade do cenário, acima descrito, não permite fórmulas reducionistas. 
Com certeza os estímulos positivos são essenciais para o alcance dos objetivos em processos de aprendizagem eficazes que só poderão ser projetados em uma escola que represente um continente de segurança tanto para alunos como para educadores e no qual, educadores autorizados à coerência entre ações e propósitos, sejam reconhecidos pelos alunos porque a sociedade e o Estado lhes conferem autoridade. Temos que considerar ainda que os estímulos positivos devam estar contextualizados pelos limites da norma que rege o convívio social. Nesse sentido, aquele que a desrespeitar deverá responder consistentemente pela sua escolha, o que não deve ser entendido como punição, mas como um estímulo positivo para integração ao convívio social e valorização do bem estar comum. É somente nesse contexto que a escola assumirá a sua função social: educar.
Se a família não coloca limites, se a Escola – hoje desautorizada – não coloca limites, se a polícia – também desautorizada – não coloca limites e o Judiciário não exerce com eficácia o seu Poder, a delinquência organizada impõe a sua lei: silêncio, tortura e homicídio.
Esse é o cenário que explica a síndrome de Burnout fazendo-nos compreender o desabafo da Profª. Guilhermina Borges de Araujo:
“Não conseguia entender o desânimo e as crises de choro que me acometiam ao lembrar-me do quanto fui engajada em realizar um excelente trabalho junto aos meus alunos, e nunca ter sido reconhecida.
A frustração andando continuamente comigo e deixando-me com a sensação de ter feito a escolha mais errada de minha vida: tornar-me educadora.”

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