É obrigação do gestor escolar garantir que os
estudantes aprendam. Será que ele conhece e desempenha essa tarefa com
responsabilidade?
Autor: Fernando José de Almeida
A rotina de todo diretor é marcada pela variedade de
atividades. Ao chegar à escola, o que ele planejou fazer naquele dia geralmente
se perde em meio às emergências que surgem de todos os cantos. O telhado mal
vedado, a falta de um professor, o acidente de um aluno, o recurso que não
chegou. Tudo o obriga a reorganizar o plano de trabalho, sem poder adiar ou
cancelar, é claro, as prestações de contas, as reuniões na Secretaria de
Educação e a visita dos familiares dos alunos. Assim, as funções primordiais do
cargo vão se perdendo e correm o risco de cair no esquecimento. Aliás, quais
são elas mesmo?
Uma pesquisa feita pela Fundação Victor Civita (FVC),
em parceria com o Ibope (Instituto Brasileiro de Opinião Pública e
Estatística), constatou que o dia a dia do gestor é mais marcado por essas
tarefas do que pelo que seriam as três principais preocupações inerentes ao
cargo:
·
· dirigir
a relação entre ensino e aprendizagem;
·
· orientar
para o saber;
·
· gerenciar
o conhecimento.
·
Se a escola é o lugar formal do conhecimento, onde se
formam o trabalhador de amanhã, o leitor e o escritor competente e o indivíduo
ético, nada mais óbvio que a instituição tenha de ser bem gerida em todos os
aspectos para funcionar com êxito. Porém a falta de uma visão integrada entre o
administrativo e o pedagógico leva os diretores a outro equívoco, também
apontado no estudo: nenhum dos gestores entrevistados atribui a si próprio a
responsabilidade pelo baixo desempenho dos alunos. Há outros fatores que também
espantam. Eles creditam a culpa pelos resultados ruins das escolas, no que diz
respeito à aprendizagem, ao governo (48%), à comunidade (16%), aos professores
(13%), aos alunos (9%) e até mesmo à escola (7%) - como se a instituição fosse
um elemento independente de suas esferas constituintes.
Com isso, fica evidente que eles ainda desconhecem sua
máxima obrigação e resumem sua atuação à burocracia. Mesmo que existam os coordenadores
pedagógicos e as universidades e as Secretarias de Educação colaborem com o
processo de formação em serviço dos docentes, a responsabilidade pelo
desempenho insatisfatório dos alunos é do gestor. Durante as entrevistas da
pesquisa, eles só assumem que a aprendizagem também os compete quando
questionados diretamente sobre ela.
Para que a direção da escola fosse citada (e ainda
assim pouco responsabilizada) pelos entrevistados, foi preciso que os
pesquisadores perguntassem a todos quem era mais responsável pelo aprendizado
dos alunos. Assim, eles apontaram, em primeiro lugar, a comunidade (45%).
Depois, os professores (42%), os alunos (29%) e só então a direção (26%) -
esses e outros resultados são o tema da reportagem de capa da revista GESTÃO ESCOLAR
de outubro/novembro. Os porcentuais indicam com clareza que os diretores acham
que os alunos têm mais responsabilidade que eles se não aprendem. Assumem a
tarefa, mas não o fracasso dela.
É como se o mundo da Educação vivesse o mesmo problema
que recai sobre a seleção brasileira de futebol em época de Copa do Mundo.
Todos se sentem técnicos e julgam ter as melhores estratégias para vencer um
jogo. Mas ninguém se sente culpado quando a derrota ocorre e o problema fica no
ar, sem autor. Por isso, o governo aparece na pesquisa como o primeiro
responsável pelo fracasso: é uma estrutura impessoal, etérea, fluida, que
funciona como se não tivesse sido eleita por ninguém.
O diretor não está sozinho nesse pensamento
equivocado. Todos nós temos uma porção de responsabilidade. Ainda assim, é
urgente o entendimento de que o gestor que não assume a tarefa de garantir a
aprendizagem das crianças não compreende seu papel.
Fernando José de Almeida (gestao@abril.com.br) é
filósofo, docente da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e
vice-presidente da TV Cultura - Fundação Padre Anchieta.
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