Fonte: Livraria da Folha
De acordo com a pesquisa histórica
realizada por Françoise Waquet, diretora de pesquisa do CNRS (Centro Nacional
de Pesquisas Científicas da França), mestres e discípulos criam um vínculo
emotivo semelhante a de pais e filhos.
Produto desse estudo --e com um
título condizente-- "Os Filhos de Sócrates" percorre séculos de
história e reúne exemplos das mais diversas áreas, apresentando a figura
universal do mestre, cujo arquétipo é Sócrates.
O filósofo não ficou famoso apenas
por ser o ideal de professor, mas também pela fama de seus alunos, como Platão.
O volume demonstra a diversidade e a complexidade de uma relação fundada no
poder e no afeto, desvelando "um laço da alma".
Essa relação pessoal passar a
existir como o modo de transmissão do verdadeiro saber, em contraste com o
conhecimento dos livros. Abaixo, leia um trecho do livro.
A
honra de ser aluno
A notoriedade do mestre também
atinge o discípulo, ela se incorpora a seu capital. Isso é particularmente
nítido em diversos rituais universitários. Por espécie de efeito especular, a
honra prestada ao mestre se reflete no discípulo.
As coletâneas são frequentemente
organizadas por discípulos, muitas contendo bibliografia e biografia do
homenageado, depoimentos, artigos. Seus nomes podem, portanto, aparecer várias
vezes no volume, às vezes na folha de rosto, próximo ao do mestre. Ademais, o
elogio do mestre a coletâneas explicitamente apresentadas como a melhor prova
de fecundidade de um ensinamento - lembrando "do fruto se julga a
árvore" das coletâneas Folena - reverte aos autores de boas contribuições.
A mesma demonstração se poderia fazer para as cerimônias de jubileu, que são
igualmente uma representação elogiosa dos discípulos. Aí também os discursos
unem o mestre e os alunos na mesma celebração. Afirmar, como no jubileu do
professor de Direito Paul-Frédéric Girard, que "o sucesso dos alunos
atesta o mérito do mestre", aumenta a glória deste; o elogio continua
valendo para os primeiros, que não deixaram de ter triunfado.
Uma dedicatória, um agradecimento
podem igualmente ser lidos nos dois sentidos. Eles honram o homenageado, mesmo
porque cumprimentos e elogios geralmente lá estão presentes. Eles também
conduzem estrategicamente o autor a ter seu nome associado a alguém importante.
Isso está claramente explicado no prefácio de obra de Pierre de La Coste
Messelière, que agradou a seus dois mestres e lhes dedicou sua obra sobre
Delfos. "Era justo seus nomes no frontispício; assim, para que se
tolerassem, ao lado de nomes ilustres, obras menos ambiciosas, estas eram
dedicadas antigamente ao deus de delfos; marcadas por seus signo, reivindicaram
a honra de terem sido por ele suscitadas e aceitas, o que comprometia um pouco
sua responsabilidade e lhe conferia algum prestígio".
Declarar-se aluno de mestre famoso
causa a mesma reciprocidade: algo da homenagem prestada reverte ao aluno. Não
faltam aqueles que expressam "a honra" e "o orgulho" de ter
sido alunos de mestre eminente, apresentando tal condição como
"título". Bastará o exemplo "Eu sou o aluno de Bufnoir" que
os alunos do professor de direito afirmavam "com orgulho do cidadão romano
reivindicando a nobreza de sua origem". O mesmo vale para as placas na
Itália colocadas por alunos sobre o túmulo de seu mestre, declinando sua
condição, e para aquelas sobre o túmulo de aluno mencionando mestre ilustre: a
homenagem a um enaltece o orgulho do outro. Do mesmo modo, a notoriedade do
mestre beneficia o discípulo, que recolhe suas últimas palavras, que é
encarregado da publicação dos originais; todas essas circunstâncias pessoais o
discípulo rememora em necrológio, biografia, prefácio, evocando distinção,
honra e orgulho.
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